Filósofos, psicólogos e o toque
Todos os anos, museus de todo o mundo arcam com o custo de reparar danos causados às suas obras pelos visitantes que as tocam.
Mas por que as pessoas querem tocar em objetos que podem ver claramente? O que esse toque oferece que a visão não é capaz de oferecer?
Os filósofos, desde René Descartes (1596-1650), notaram que o toque proporciona "um senso de realidade" e nos faz sentir em contato com o mundo externo. Em contraste, os psicólogos tendem a supor que o toque não tem superioridade intrínseca sobre os outros sentidos.
O fato é que nossa tendência a "checar os fatos" pelo toque é comum, mas permanece inexplicável: do relato bíblico do apóstolo Tomé, vemos agora um "efeito Tomé" nos telefones celulares e outras novas tecnologias, onde as pessoas ainda preferem pressionar botões do que simplesmente selecionar itens em uma tela, e no varejo, onde as lojas que permitem que as pessoas toquem os produtos vendam mais. Em estudos clínicos, pacientes compulsivos tendem a verificar portas ou fechaduras tocando-as, mesmo que possam ver que estão fechadas.
Tato versus visão
Agora, um grupo interdisciplinar de pesquisadores das universidades Ludwig-Maximilians de Munique (Alemanha) e de Londres (Inglaterra) afirmam ter obtido "a primeira evidência científica" de que, quando confrontados com informações ambíguas, confiamos mais em nossos dedos do que em nossos olhos.
No experimento, eles usaram uma ilusão de percepção - a ilusão horizontal-vertical - que afeta simultaneamente a forma como vemos e como sentimos os objetos e seus formatos. Por exemplo, dois palitos de fósforo podem compôr uma forma de T invertido; quando os dois palitos têm comprimentos iguais, o vertical parece maior tanto na aparência quanto na sensação. Os participantes foram avaliados usando uma variedade de comprimentos: alguns em que os palitos pareciam próximos em comprimento e alguns em que um parecia claramente mais longo do que o outro.
Eles se mostraram melhores em julgar o comprimento dos fósforos por visão do que por toque e, sem surpresa, mostraram-se geralmente mais confiantes na visão também. Porém, quando os comprimentos eram difíceis de avaliar, e os participantes estavam efetivamente adivinhando, eles adivinhavam com mais confiança quando tocavam os objetos do que quando os viam.
"A partir de nossos dados, parece que, quando o contexto é ambíguo, nosso senso de toque faz algo além de nos fornecer informações precisas - nos dá uma sensação de certeza - uma checagem mais aprimorada da realidade," disse a pesquisadora Merle Fairhurst.
"Dar sentido ao status especial do toque parece incrivelmente difícil para a neurociência moderna. No final das contas, o toque é como os outros sentidos: às vezes é bom, ruim em outras ocasiões, e tudo depende do contexto e da tarefa. O que mostramos aqui é que o toque não é melhor ou mais preciso do que os outros sentidos, mas que nos faz nos sentir melhor. Isso mostra que Descartes estava certo, quando ele disse que o toque era o sentido mais difícil de se duvidar," acrescentou a professora Ophelia Deroy, coordenadora do trabalho.
Os resultados sugerem que as possíveis origens da checagem tátil dos fatos, na vida cotidiana ou nos transtornos compulsivos, não estão apenas na necessidade de ter um segundo tipo de "teste de sanidade" sobre a realidade, mas vem do tipo específico de segurança que o toque proporciona. Ver, como a expressão diz, pode nos fazer crer, mas sentir nos dá uma sensação de verdade.
A pesquisa foi publicada na revista Nature Scientific Reports.
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