29/12/2022

Como farmacêuticas manipulam patentes para combater genéricos

Com informações da West Virginia University
Como farmacêuticas manipulam patentes para combater genéricos
As empresas farmacêuticas usam "matagais de patentes" - várias patentes cobrindo o mesmo medicamento - para manipular o sistema de patentes a fim de manter uma vantagem sobre os genéricos, dizem os pesquisadores.
[Imagem: WVU Graphic/Peter Habuda]

Mau uso das patentes

Na competição entre produtos farmacêuticos de marca e seus homólogos genéricos, as empresas farmacêuticas usam o campo das patentes a seu favor, afirmam especialistas na área.

A equipe do professor Sean Tu, da Universidade Oeste da Virgínia (EUA), estuda patentes e como elas influenciam os preços e a inovação dos medicamentos. O interesse maior está em desvendar os mecanismos que as empresas donas das marcas usam para manipular o sistema de patentes para manter indevidamente os direitos de monopólio sobre produtos farmacêuticos, movimentos que potencialmente afetam o bem-estar dos pacientes.

Uma dessas estratégias é o que os especialistas chamam de "matagais de patentes", ou moitas de patentes, uma série de patentes sobrepostas sobre o mesmo produto.

Entre 2000 e 2018, as empresas farmacêuticas faturaram US$ 8,6 trilhões, ganhando significativamente mais do que a maioria das indústrias, de acordo com Tu. No entanto, uma vez que os genéricos entram no mercado, os preços dos medicamentos podem cair 90%, diminuindo assim os lucros dos fabricantes de marcas.

"Como essas drogas rendem toneladas de dinheiro, para proteger seus lucros as empresas farmacêuticas estão transformando as patentes em armas. Elas criam grandes 'moitas de patentes', que são apenas múltiplas patentes que cobrem o mesmo produto. Esses matagais são projetados para retardar ou impedir que competidores entrem no mercado," explicou o professor Tu.

Patentes como armas da indústria farmacêutica

Um exemplo de empresa que o pesquisador cita no emprego dos matagais de patentes é a Amarin, que detém mais de 100 patentes sobre o óleo de peixe. Embora o suplemento já exista há muitos anos, o professor Tu afirma que esse emaranhado de patentes torna mais difícil para os genéricos entrarem no mercado. Isso ocorre porque as empresas de genéricos terão que estudar todas essas patentes antes de lançar uma versão genérica do medicamento.

Outro exemplo é o medicamento mais vendido do mundo, o Humira, fabricado pela AbbVie, com receita de quase US$ 21 bilhões apenas em 2021. A AbbVie também utiliza moitas de patentes para proteger o Humira, um imunossupressor usado para tratar condições como artrite, psoríase em placas e doença de Crohn.

"São cerca de US$ 57 milhões por dia," calcula Tu. "Como eles fizeram isso? Eles construíram um emaranhado de patentes. Eles solicitaram pelo menos 247 patentes do Humira e atualmente possuem mais de 132 patentes cobrindo a droga."

Uma segunda estratégia, às vezes conectada, é chamada de "verdejamento", ou perenificação, na qual as empresas registram patentes em série para prolongar a vida útil do produto. Com o Humira, aproximadamente 90% dos registros de patentes foram feitos depois que o medicamento já estava no mercado.

O verdejamento e os matagais de patentes são mais prevalentes no mercado dos EUA. Na Europa, é difícil receber várias patentes do mesmo produto, facilitando assim a entrada no mercado de medicamentos genéricos ou similares, conhecidos como "biossimilares".

"Na Europa, os biossimilares Humira já estão no mercado desde 2018," contou Tu. "Então, por que não podemos fazer a mesma coisa aqui? Os EUA não obterão um biossimilar Humira até 2023. Muito disso é porque as empresas farmacêuticas jogam esses jogos de patentes para atrasar ou impedir a entrada."

Sistema de patentes justo

A extensa natureza da lei de patentes também torna complicadas pesquisas como a de Tu e sua equipe, que são necessárias para mostrar como as empresas podem usar os meandros da lei para fazer coisas contra o bem-estar público.

"O que essas empresas estão fazendo é completamente legal. No entanto, essas empresas estão tirando vantagem do sistema de patentes e manipulando o sistema para fazer coisas para as quais esse sistema nunca foi projetado," disse o pesquisador.

Embora ele acredite que os matagais de patentes e a perenificação deem às empresas uma vantagem injusta, ele acredita no sistema de patentes em sua forma mais verdadeira.

"Meu objetivo é ajudar a criar um sistema de saúde que seja seguro, eficaz, centrado no paciente, oportuno, eficiente e equitativo. Gostaria de ver medicamentos novos, inovadores e revolucionários que ajudem os pacientes a um custo acessível. Eu gostaria de ter um sistema que coloca os pacientes em primeiro lugar," concluiu ele.

Checagem com artigo científico:

Artigo: Product Hopping in the Drug Industry - Lessons from Albuterol
Autores: Olivier J. Wouters, William B. Feldman, D. Phil, S. Sean Tu
Publicação: New England Journal of Medicine
Vol.: 387:1153-1156
DOI: 10.1056/NEJMp2208613
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