Geração covid
Mais de 47 milhões de mulheres em todo o mundo podem ter o acesso a métodos contraceptivos dificultado durante a pandemia de covid-19, o que pode resultar em 7 milhões de gestações não planejadas nos próximos meses, segundo projeções do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA).
Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) alertam que também no Brasil o impacto sobre a saúde das mulheres será imenso caso os serviços públicos de planejamento familiar - que garantem o acesso à contracepção para as dependentes do Sistema Único de Saúde (SUS) - não sejam incluídos no rol de atividades essenciais.
E estudos preliminares já encontraram sinais de danos à placenta de mulheres que contraíram o vírus sars-cov-2, causador da covid-19, durante a gravidez.
"Ainda há pouca informação sobre os riscos de transmissão vertical do novo coronavírus [quando o feto é contaminado ainda no útero ou durante o parto] ou pelo leite materno. Também não se sabe se a infecção no início da gravidez pode causar algum tipo de problema para o bebê, como ocorre no caso do vírus zika. Muitas mulheres estão apavoradas com a ideia de engravidar e contrair a covid-19 e elas devem ser atendidas," afirma o ginecologista Luis Bahamondes.
Como destacam Luis e sua colega Maria Makuch, gestações não planejadas estão associadas a fatores como aborto inseguro, acompanhamento pré-natal inadequado e complicações na gravidez, que resultam no aumento das taxas de morbimortalidade materna e infantil. Por esses motivos, diz o texto, "métodos contraceptivos salvam vidas".
No Brasil, a estimativa é que 52% das gestações não sejam planejadas e que, entre as adolescentes, o número chegue a 62%. Além disso, apenas 2% das brasileiras em idade fértil (15 a 49 anos) têm acesso a métodos contraceptivos de longa duração, como o DIU (dispositivo intrauterino com cobre ou liberador de hormônio) e implantes, considerados os mais eficazes na prevenção da gravidez. No SUS, somente está disponível o DIU com cobre e não em todas as unidades de saúde.
Planejamento familiar é atividade essencial
De acordo com os pesquisadores, aproximadamente 20 milhões de mulheres no Brasil dependem dos ambulatórios públicos de planejamento familiar para ter acesso a contraceptivos de longa duração e, desde o início da pandemia, a maior parte desses serviços ou está fechada ou funciona de forma restrita. "Na rede privada, por outro lado, o atendimento aparentemente está normal. Esta é mais uma faceta da desigualdade social no país," diz o pesquisador.
Mesmo o acesso à pílula anticoncepcional pelo SUS tornou-se mais difícil durante a pandemia, conta o ginecologista, pois muitas Unidades Básicas de Saúde (UBS) que fazem a prescrição e a dispensação do fármaco, estão limitando o atendimento a pessoas que apresentam febre, tosse ou outros sintomas da covid-19.
Na avaliação do pesquisador, o acesso a métodos contraceptivos como pílula, injetáveis e anel vaginal poderia ser facilitado durante a pandemia pelo envio de receitas eletrônicas por e-mail ou aplicativos de bate-papo. As dúvidas poderiam ser esclarecidas pelo médico remotamente.
"Mesmo a colocação de DIU ou implante, que requer atendimento presencial, pode ser feito de forma segura com o uso de equipamentos de proteção individual e outras medidas de proteção. Uma possibilidade, por exemplo, seria transferir parte da sala de espera para uma área ao ar livre e colocar as cadeiras bem afastadas, Em alguns locais fora do Brasil, adotou-se um anteparo de acrílico entre o médico e a paciente," conta o pesquisador.
Para as mulheres que fazem uso de contraceptivos de longa duração em vias de atingir o prazo de validade aprovado, a recomendação, segundo Bahamondes, é esperar o término do isolamento físico para fazer a substituição. "Dados da literatura científica indicam ser seguro aguardar por até um ou dois anos após o vencimento," afirma.
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