Despreparo para o atendimento
O Ministério da Saúde instituiu o acompanhamento dos casos de câncer em todos os níveis do sistema público.
Mas, de acordo com uma pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP, os trabalhadores da Estratégia de Saúde da Família (ESF) não têm informações precisas sobre a doença e sua prevalência que permitam atendimento qualificado a todos os usuários.
O estudo recomenda maior capacitação das equipes e articulação com ambulatórios especializados e hospitais secundários e terciários, para acompanharem a atenção dada aos pacientes com câncer.
Atendimento ao câncer no SUS
A enfermeira Giovana Paula Rezende Simino, que realizou a pesquisa, explica que o Ministério da Saúde implantou em 2005 a Política Nacional de Atenção Oncológica (PNAO).
"A iniciativa prevê ações de acompanhamento dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) com câncer, incluindo ações que devem contemplar da prevenção aos cuidados paliativos, nos níveis de atenção básico, secundário e terciário de atendimento", afirma. "O estudo enfocou as ações dos trabalhadores da Estratégia de Saúde da Família, que integram a Atenção Básica, junto com as Unidades Básicas de Saúde (UBS)".
Desconhecimento da doença
Ao todo, foram entrevistados 101 trabalhadores que atuam nas 13 unidades da ESF, no Distrito de Saúde Oeste de Ribeirão Preto (interior de São Paulo), incluindo médicos, enfermeiros, dentistas, auxiliares e técnicos de enfermagem, auxiliares de consultório odontológico e agentes comunitários de saúde (que são 59% do total de trabalhadores).
"Dos entrevistados, 70% nunca trabalharam com portadores de câncer antes de atuar com Saúde da Família", aponta Giovana, "especialmente agentes comunitários, que em geral não tem formação em saúde e recebem treinamento em serviço".
De acordo com a pesquisadora, 80% dos trabalhadores sabem que existem pacientes com câncer em suas áreas de atuação e 63% realizam atendimento, mas apenas 13% sabem a quantidade exata de casos na região. Apenas 24 entrevistados sabiam o tipo de câncer com maior prevalência (mama). "Esses números mostram que a PNAO não foi incorporada, pois deve ser feito o acompanhamento de saúde da totalidade dos usuários", ressalta. "O Ministério da Saúde recomenda que a ESF atenda e resolva cerca 80% dos problemas apresentados pelos usuários".
Vínculo com as famílias
Os usuários atendidos pela ESF com câncer são incluídos no atendimento por meio de exames preventivos, visitas domiciliares e queixas de saúde. "Há grandes possibilidades de atuação por parte das equipes, devido ao vínculo com as famílias e o conhecimento sobre elas", aponta Giovana. "Mesmo que o tratamento não possa ser feito nas equipes de Saúde da Família , os trabalhadores podem auxiliar a resolver dúvidas sobre remédios, dor, e apoiar o cuidador em casos mais graves", entre outros.
As narrativas dos trabalhadores evidenciam que na Atenção Básica também podem ser realizados alguns procedimentos técnicos, como consultas com médicos e enfermeiros, inserção de sondas, administração de medicação e realização de curativos . Segundo a enfermeira, o Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB) não cobra das unidades da ESF o número de usuários com câncer, da mesma forma que exige dados sobre crianças menores de um ano, gestantes e casos de diabetes e hipertensão. "Esses números sobre o acompanhamento das famílias servem de base para o repasse de recursos para o atendimento", afirma.
Falta de articulação
A pesquisa indica que uma das principais demandas dos trabalhadores é a maior articulação dos serviços de saúde. "Em muitos casos eles realizam a referência do usuário os e encaminham para o atendimento secundário e terciário, mas não recebem a contra-referência dos hospitais e ficam sem informações essenciais para acompanhá-los", destaca Giovana. "Trabalhadores e serviços da Atenção Básica também necessitam se articular fora do sistema de saúde, com instituições filantrópicas e organizações ligadas ao terceiro setor, para apoio às necessidades destes usuários."
A enfermeira defende o reforço à política de educação permanente em saúde para lidar com os casos de câncer. "Os trabalhadores relatam que apesar do trabalho de prevenção, trata-se de uma doença complexa, imprevisível e perversa", diz. "Devido ao diagnóstico tardio em vários casos, é preciso conviver constantemente com a perspectiva de morte do paciente". O trabalho teve orientação da professora Silvana Martins Mishima, da EERP.
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