29/08/2023

Plasticidade cerebral na visão é comprovada em adultos

Redação do Diário da Saúde
Plasticidade cerebral na visão é comprovada em adultos
É mais uma prova de que a plasticidade cerebral não é interrompida pela idade.
[Imagem: Joana Carvalho et al. - 10.1371/journal.pbio.3002229]

Estudar a plasticidade

Pesquisadores portugueses abriram novas perspectivas para a compreensão da plasticidade do cérebro, com implicações para os domínios da reabilitação visual e das terapias de restauração visual.

Tal como acontece com as crianças pequenas, que conseguem aprender línguas muito rapidamente nos primeiros anos de vida, o nosso sistema visual também tem um período crítico durante os primeiros anos de vida, quando ocorre um desenvolvimento rápido. Após esse período, as mudanças tornam-se mais difíceis.

De fato, muitos tratamentos destinados a restaurar a visão, como os que são usados para as cataratas congênitas ou o "olho preguiçoso", só são eficazes até os 7 anos de idade. Com o aparecimento de várias técnicas, já estabelecidas ou emergentes, para restaurar a visão em adultos, incluindo a terapia genética, os olhos biônicos e as cirurgias, é vital compreender se o cérebro adulto consegue processar os novos sinais visuais que essas novas tecnologias irão lhe enviar.

Como isso precisa ser estudado em animais de laboratório, os pesquisadores da Fundação Champalimaud (Portugal) criaram uma configuração que permite pela primeira vez fornecer estímulos visuais complexos dentro do espaço confinado de um escâner de ressonância magnética (MRI). Isto era um desafio tido como impossível de ser superado porque envolve colocar aparelhos eletrônicos delicados sob a ação de alguns dos campos magnéticos mais fortes que se consegue gerar.

Deu certo, e o aparato já está permitindo explorar se o cérebro adulto dos mamíferos ainda possui a capacidade de se reorganizar, e mudar, mesmo depois de passado o período crítico de desenvolvimento.

Plasticidade cerebral na visão é comprovada em adultos
O aparato experimental desenvolvido pela equipe também será utilizado para estudar a doença de Parkinson.
[Imagem: Joana Carvalho et al. - 10.1371/journal.pbio.3002229]

Plasticidade no cérebro adulto

Com a ajuda do avanço tecnológico, os pesquisadores descobriram que, quando roedores mantidos no escuro desde o seu nascimento foram expostos à luz pela primeira vez na idade adulta - muito depois de ter decorrido o período crítico - os seus cérebros sofreram uma reorganização e adaptação significativas, revelando um grau de plasticidade notável.

Isto não só fornece uma prova contundente de que o cérebro adulto continua a ser altamente plástico, desafiando o saber científico anterior sobre uma hipotética "rigidez do cérebro adulto", como também abre novas perspectivas para o desenvolvimento de tratamentos de reabilitação visual.

"Surpreendentemente, em menos de um mês, a estrutura e a função do sistema visual dos animais privados de visão tornaram-se semelhantes às dos controles. Embora a plasticidade tenha sido observada nos seres humanos, a sua interpretação continua a ser muito difícil. O que estamos vendo aqui em roedores, que oferece uma visão dos mecanismos cerebrais que não é possível obter em estudos humanos, é um fenômeno que não foi observado antes: Plasticidade em grande escala no cérebro adulto em toda a via visual, e não apenas localizada numa área cerebral específica, como demonstrado em trabalhos anteriores," disse Noam Shemesh, membro da equipe.

Estudos anteriores recorreram a técnicas como a eletrofisiologia e a imagiologia do cálcio, que focam em regiões cerebrais isoladas e não permitem uma visão global do sistema visual. Estes métodos invasivos - embora forneçam leituras diretas da atividade neural - podem levar à detecção de alterações não relacionadas com a plasticidade real, pelo fato de potencialmente introduzirem fatores de confusão, e devido à dificuldade de monitorar as mesmas células em momentos diferentes.

Embora não tenha a especificidade de uma célula única e reflita indiretamente a atividade neuronal, a ressonância magnética funcional facilita a medição longitudinal e não invasiva de áreas visuais na sua totalidade, com uma resolução muito elevada. "Como resultado, uma das coisas intrigantes que pudemos observar foi que uma parte da via visual, chamada colículo superior, parece demorar mais tempo a adaptar-se em animais com privação visual, em comparação com outras áreas, como o córtex. É algo que gostaríamos de explorar mais. Isto também realça a importância de uma visão integrada de todo o sistema, no mesmo animal, ao longo de vários períodos de tempo," disse a professora Joana Carvalho, coordenadora da equipe.

Além disso, as técnicas desenvolvidas pela equipe são extensíveis a outros modelos de doenças animais, incluindo, por exemplo, a doença de Parkinson.

Checagem com artigo científico:

Artigo: Extensive topographic remapping and functional sharpening in the adult rat visual pathway upon first visual experience
Autores: Joana Carvalho, Francisca Fernandes, Noam Shemesh
Publicação: PLoS Biology
DOI: 10.1371/journal.pbio.3002229
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