14/06/2023

Luz azul do celular (provavelmente) não faz mal para sua pele

Redação do Diário da Saúde
Luz azul do celular (provavelmente) não faz mal para sua pele
A exposição à luz azul é um tema complexo, com efeitos indo do positivo ao negativo, dependendo da dose e da cor exata.
[Imagem: Freepik]

"Não dissemos isto"

Uma pesquisa realizada por cientistas da USP ganhou as manchetes em todo o país nos últimos dias, ao mostrar que o excesso de luz violeta e azul pode causar efeitos danosos à pele.

O problema é que alguns sites e jornais vincularam os efeitos com a luz azul emitida pelos celulares, algo que a pesquisa não demonstrou. Devido ao seu alcance, uma reportagem do jornal O Globo chamou a atenção dos pesquisadores, que vieram a público desfazer o mal-entendido.

"A relação no título da notícia do jornal foi infeliz e pode levar a entendimentos errôneos por parte dos leitores. Muito embora tanto o Sol quanto o celular emitam luz na região do azul, o artigo científico mencionado não estudou o efeito da luz emitida por aparelhos celulares e sim, o efeito de irradiação a partir de fontes que imitam os raios solares," explicou o professor Maurício Baptista, responsável pela pesquisa.

Ou seja, não é que a luz azul dos celulares não tenha esse efeito: A equipe não pesquisou a luz emitida pelas telas. Outras pesquisas, contudo, já demonstraram que a luz azul das telas acelera o processo de envelhecimento e pode até destruir células da nossa retina.

Luz natural versus luz artificial

No caso dos danos à pele, a principal diferença parece estar na dose: As irradiâncias do celular são muito menores do que as vindas do Sol e o efeito da radiação luminosa na pele não é linear, sendo que doses pequenas são benéficas, enquanto as maiores são danosas - irradiância (W/m2) é uma medida da energia luminosa por unidade de tempo e de área.

Considerando a irradiância total direta do Sol versus a do celular em toda faixa da luz visível, a irradiância solar é de aproximadamente 1000 W/m2 e a dos aparelhos celulares, a 10 centímetros (cm) de distância da superfície, é de 0,05 W/m2. Isso quer dizer que a irradiância do celular é cerca de 20 mil vezes menor do que a do Sol.

Mesmo considerando a irradiância difusa do Sol, isto é, quando a exposição não é direta, por exemplo, se estivermos embaixo do guarda-sol, a irradiância é em torno de 100 W/m2, ainda assim duas mil vezes maior do que a do celular. Considerando somente a região do azul e a irradiância por faixa de comprimento de onda (W.m-2.nm-1), os celulares emitem em torno de 0,03 W.m-2.nm-1, enquanto a irradiância difusa do Sol é de cerca de 30 W.m-2.nm-1, ou seja, a do celular é mil vezes menor.

Por outro lado, ninguém fica sob o Sol o dia todo, e costumamos usar o celular e o computador na quase totalidade do tempo. Desta, serão necessários estudos comparativos específicos para mensurar o eventual impacto da luz azul das telas sobre a pele humana.

A luz azul, à qual nossos olhos são sensíveis, representa cerca de 47% da radiação solar total que atinge a pele humana, em comparação com cerca de 5% de radiação ultravioleta. E também é a faixa espectral que forma os maiores níveis de radicais livres gerados na pele sob exposição solar, respondendo por 50% do total. Os mecanismos de dano induzidos pela radiação solar se devem principalmente à fotossensibilização, um processo no qual moléculas sensíveis à luz transformam a energia da luz em reatividade química.

Luz azul do celular (provavelmente) não faz mal para sua pele
Como o excesso de luz azul de telas acelera processo de envelhecimento, já estão em desenvolvimento óculos que filtram luz azul para nos proteger dos danos das telas.
[Imagem: Swanwick/Divulgação]

Preocupação com os olhos

Um aspecto importante, segundo o pesquisador, é o efeito que diferentes exposições à luz causam na pele. À medida que evoluímos sob a influência da luz solar, desenvolvemos mecanismos para utilizá-la eficientemente em funções fisiológicas essenciais e para proteger o corpo contra sua quantidade excessiva. Desta forma, exposições curtas ao Sol geralmente trazem efeitos benéficos. Atualmente, equipamentos que imitam essas doses saudáveis de exposição estão sendo utilizados em tratamentos médicos.

No caso do estudo realizado pela equipe, usando células chamadas queratinócitos, os efeitos danosos foram observados ao irradiar as células durante várias horas com fontes que imitam a irradiância do Sol. Doses menores não causaram efeitos ou tiveram efeitos favoráveis. "Considerando a pequena irradiância dos celulares, podemos afirmar que, se houver algum efeito, este será favorável à pele de humanos saudáveis," arrisca o pesquisador.

Já em relação aos olhos, a estrutura do tecido favorece a penetração de luz visível e há muitas pesquisas demonstrando como a exposição desprotegida à luz azul do Sol e de equipamentos diversos que emitem luz nesta faixa pode afetar a retina. Entretanto, segundo Baptista, não há consenso, pois, com base em diversos trabalhos, muitos oftalmologistas defendem que a dose de luz dos celulares é muito pequena para causar problemas na visão.

O que é certo é que a exposição noturna à luz azul de celulares, tablets, laptops etc. perturba o ciclo natural de sono/vigília do nosso corpo, conhecido como ritmo circadiano. Ocorre que, também aqui, a luz azul pode ser usada de forma criteriosa, ajudando a melhorar o sono e a ansiedade, combater a fadiga e até para melhorar a produtividade dos trabalhadores. Ou seja, a luz pode ser uma terapia de alta eficiência.

Checagem com artigo científico:

Artigo: The phototoxicity action spectra of visible light in HaCaT keratinocytes
Autores: Paulo Newton Tonolli, Carlos M. Vera Palomino, Helena C. Junqueira, Mauricio S. Baptista
Publicação: Journal of Photochemistry & Photobiology, B: Biology
Vol.: 243, 112703
DOI: 10.1016/j.jphotobiol.2023.112703
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