Dilema de dupla utilização
A nanotecnologia tem alimentado muitas esperanças de tratamentos para a saúde com um nível de eficácia que não é obtido pelos medicamentos atuais.
Embora esse conhecimento tenha o potencial de ajudar a muitos, também é possível que as mesmas descobertas sejam usadas de maneiras que causem danos generalizados.
Um relatório publicado na edição deste mês da revista Nanomedicine, resultado de um encontro científico realizado na Universidade de Notre Dame (EUA), aborda diretamente essa complexa possibilidade de "dupla utilização" das pesquisas em nanotecnologia.
"O ritmo acelerado dos avanços em nanotecnologia, biotecnologia e outras áreas mantém a promessa de grandes melhorias em áreas como diagnóstico e tratamento médico," afirma a Dra Kathleen Eggleson, coautora do estudo.
"Mas o risco de mau uso desses avanços também aumenta passo a passo com os potenciais benefícios. Esta é a essência do 'dilema de dupla utilização', explica pesquisadora.
Nanoarma química
O relatório analisa o potencial das nanopartículas (partículas com dimensões medidas em bilionésimos de metro) para romper a barreira sangue-cérebro, a camada coesa de células que dá ao cérebro o maior nível de proteção encontrado no corpo humano, protegendo-o de microorganismos, moléculas nocivas etc.
Alguns neurocientistas estão propositadamente desenvolvendo nanopartículas capazes de cruzar a barreira sangue-cérebro, de modo a levar medicamentos de uma maneira específica e controlada diretamente para partes doentes no interior do cérebro:
Ao mesmo tempo, cita o relatório, "nanopartículas concebidas para atravessar a barreira sangue-cérebro constituem uma ameaça grave - no contexto de guerras".
Por exemplo, avalia-se que "o lançamento de aerossóis" de algum agente fruto da nanoengenharia em "um espaço fechado lotado" possa causar sérios danos a muitas pessoas ao mesmo tempo.
Enfim, uma arma química de destruição em massa - uma nanoarma química, ou uma arma química nanotecnológica, como se queira.
Riscos da nanotecnologia
Não é a primeira vez que os próprios cientistas se manifestam sobre os riscos da nanotecnologia.
O problema da dupla utilização das pesquisas científicas foi destaque no ano passado, com uma controvérsia que irrompeu quando duas revistas científicas recusaram-se a publicar os resultados que indicavam como, com um punhado de modificações, o vírus da gripe H5N1 ("gripe aviária") pode ser alterado de uma forma que lhe permita ser transmitido entre populações de mamíferos.
Os estudos sobre o vírus mutante da gripe aviária permaneceram censurados por algum tempo, mas finalmente os estudos foram publicados.
Agora, depois de uma moratória de um ano, vários laboratórios ao redor do mundo anunciaram que estão reiniciando os trabalhos na área.
Responsabilidade
Os cientistas e engenheiros que realizam pesquisas em nanoescala têm a capacidade e a responsabilidade de considerar os aspectos de segurança pública de suas pesquisas e de agir para proteger a sociedade quando necessário, argumenta Eggleson.
"O relacionamento entre ciência e sociedade não é fácil, mas é inegável que são todos, e não qualquer indivíduo em particular, que podem optar, em nome do progresso ou em prol da humanidade", diz ela.
"A dupla utilização, e a ação quando for o caso, é inerente à prática socialmente responsável da ciência da nanobiomedicina," conclui ela.
Uma conclusão que não tem a unanimidade nem mesmo entre os cientistas: muitos defendem que, dada a história de mau uso da ciência, sobretudo para fins destrutivos, haja um controle social do que se faz nos laboratórios científicos.
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