Desigualdade econômica promove aumento da intolerância

Representação conceitual das quatro possíveis invasões analisadas: Intolerância invadindo um grupo tolerante em população totalmente tolerante (I|TT), tolerância invadindo um grupo intolerante com outro grupo permanecendo tolerante (T|IT), intolerância invadindo um grupo tolerante em uma população onde o outro grupo já se tornou intolerante (IT|I) e a tolerância invadindo um grupo intolerante em uma população totalmente intolerante (T|II).
[Imagem: Luis A. Martinez-Vaquero]

Teoria de jogos evolutiva

A desigualdade econômica tem crescido nas sociedades modernas durante os últimos anos e algumas evidências apontam que isto pode ser um fator crítico no surgimento e crescimento da intolerância e da polarização política que tem sido verificada em todo o mundo.

O professor Luis Alberto Vaquero, da Universidade Politécnica de Madrid (Espanha), decidiu avaliar essa hipótese utilizando a teoria de jogos evolutiva.

Esta é uma ferramenta que permite modelar matematicamente a interação entre indivíduos que formam parte de populações e analisar como emergem comportamentos coletivos em grande escala que não são previsíveis a partir de comportamentos individuais.

Em trabalhos anteriores, Vaquero estudou quais normas sociais emergem e se tornam resilientes, descobrindo que determinados comportamentos intolerantes emergem em minorias submetidas a dificuldades econômicas.

Neste novo trabalho, o pesquisador adaptou este modelo para incorporar a desigualdade econômica e a intolerância, estudando como uma influencia a outra. Para isso, ele analisou quais circunstâncias ou estratégias de intolerância podem invadir grupos de indivíduos tolerantes em diferentes cenários, e o que é necessário para que a tolerância possa ser restaurada.

Os resultados mostram claramente que a desigualdade é um poderoso catalisador da intolerância, dando lugar à escalada de comportamentos discriminatórios até mesmo sem a presença de novos indivíduos intolerantes que promovam a dita intolerância.

Desigualdade econômica

A desigualdade modificou até mesmo o comportamento de indivíduos tolerantes que pertenciam a minorias desfavorecidas, de modo que estes ou deixaram de penalizar os indivíduos que não cooperavam, ou preferiam ajudar os indivíduos com mais riqueza, inclusive quando eram discriminados por parte deles, em vez de ajudar os indivíduos de seu próprio grupo.

Alguns desses comportamentos, que parecem totalmente contra-intuitivos, podem explicar as diferenças observadas quando se estuda a intolerância em diferentes culturas.

Também foram estudadas as condições sob as quais a redistribuição da riqueza se converteu em uma solução viável para evitar a intolerância.

A conclusão é que é necessário garantir a redução da desigualdade e que ela seja implantada antes que a intolerância permeie parte da população. Ou seja, a redução da desigualdade econômica é um mecanismo preventivo eficaz, mas que perde a maior parte de sua capacidade se sua implementação esperar até o afloramento do comportamento intolerante no grupo.

"O objetivo deste trabalho foi, portanto, não apenas entender por que certos comportamentos e fenômenos sociais estão ocorrendo, mas também analisar o potencial êxito da implementação de políticas públicas. As conclusões desta investigação são especialmente relevantes diante do contexto de crise econômica global, motivada principalmente pela pandemia de covid-19 e pelos conflitos bélicos, e o consequente incremento da desigualdade," concluiu Vaquero.