Sequenciamentos inúteis
Conforme o sequenciamento genético tornou-se mais barato e acessível, mais e mais informações genômicas estão-se tornando disponíveis, em um ritmo que aumenta velozmente.
Quase todas as semanas é possível ler manchetes do tipo "Genoma do organismo 'tal' foi decifrado".
Mas, por enquanto, essa montanha de dados genéticos tem trazido mais decepção do que conhecimento.
Na verdade, o conhecimento que interessa - por exemplo, como os microrganismos interagem com seu ambiente, como eles infectam outros organismos e como alteram seus programas moleculares em resposta a alterações das suas condições ambientais - não é automaticamente dedutível a partir apenas dos dados genômicos.
O reconhecimento dessa "decepção com o DNA" é o eixo central de um estudo realizado conjuntamente por pesquisadores da Universidade do Sul da Dinamarca, do Instituto Max Planck (Alemanha) e da Universidade Federal de Minas Gerais.
Sequenciamento do DNA: sem respostas
Segundo os pesquisadores, no tocante ao sequenciamento genético, "estamos afogados em dados, mas morrendo de sede de conhecimento".
A equipe levanta dúvidas sobre o valor das pesquisas para sequenciar o genoma de inúmeras espécies, uma vez que o genoma não consegue trazer novos conhecimentos úteis e práticos.
Para chegar a essa conclusão, eles analisaram os genomas que se tornaram disponíveis nos últimos 20 anos graças aos trabalhos de sequenciamento de DNAs de bactérias.
Os cientistas então tentaram usar esse monte de dados para responder a uma simples pergunta: Pode-se distinguir entre bactérias que causam doenças (patogênicas) daquelas inofensivas (não-patogênicas) com base apenas no seu DNA?
Eles descobriram que isso não é possível em muitos casos, ou seja, os dados do sequenciamento genético não servem nem mesmo para fazer uma distinção tão simples, mas extremamente importante, do que faz ou não mal ao homem.
"Por que devemos nos esforçar ainda mais para coletar esse tipo de dado?" escreve a equipe.
Desperdício de recursos
O DNA de quase 3.000 espécies bacterianas já foi sequenciado até agora. Outros 24.000 projetos de sequenciamento estão atualmente em andamento, e há inúmeros projetos adicionais pretendendo sequenciar o genoma de mais organismos de todos os reinos.
"Pode-se perguntar qual é o valor de tudo isso," questionam os pesquisadores.
Para eles, a ciência e a medicina podem ter usos muito mais úteis para os recursos gastos nesses trabalhos de sequenciamento genético que não trazem resultados práticos ou conhecimentos novos.
"Devemos continuar a sequenciar o DNA de bactérias em uma escala tão grande? Talvez uma parte desse esforço e desses recursos pudesse ser melhor gasta," afirmam eles.
O estudo, cujo principal autor é o brasileiro Eudes Barbosa, foi publicado na revista científica Briefings in Functional Genomics.
Promessas esquecidas
Esta não é a primeira vez que os próprios cientistas demonstram sua decepção com o sequenciamento genético.
Na verdade, a própria imagem do DNA como algo estável, inquestionável e inconfundível está-se desfazendo rapidamente:
Agora que já foram esquecidas pelo público as inúmeras promessas que os próprios cientistas fizeram à exaustão sobre os benefícios que o sequenciamento genético traria para a medicina, a comunidade acadêmica começa a reconhecer que já é mais do que hora de rever o direcionamento dos recursos gastos nessas pesquisas.
Esquecimento do público que, a propósito, já vem nublando as grandes expectativas que os cientistas também criaram a respeito das células-tronco.
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