Culpar a vítima é usado como desculpa para não ajudar

As pessoas gostam de culpar as vítimas do infortúnio para não precisarem ajudar.
[Imagem: Ben Kerckx/Pixabay]

Culpa da vítima

Com as ferramentas de levantamento de fundos e de pedidos de ajuda disponíveis por toda a internet, é mais fácil do que nunca ajudar familiares, amigos e até estranhos em momentos de necessidade.

E, claro, também é muito fácil olhar para o outro lado, já que ninguém saberá que você viu o pedido e não clicou nele.

Mas os processos mentais e emocionais envolvidos com o não ajudar são bem mais complexos do que se pensava, com as pessoas lidando com seus conflitos internos de uma maneira inusitada: Pondo a culpa na pessoa que está pedindo ajuda.

"A maioria das pessoas se considera cooperativa e generosa, mas há um custo em ajudar as pessoas que não conseguem retribuir," disse o professor Pascal Boyer, da Universidade de Washington (EUA). "É um fenômeno generalizado, mas pouco estudado."

"Você não merece ajuda"

Para fechar essa lacuna, Boyer e seus alunos aplicaram testes a voluntários apresentando uma variedade de notícias fictícias descrevendo casos de infortúnio ou má sorte, como alguém em um acidente de carro enquanto enviava mensagens de texto e dirigia, alguém baleado por uma arma guardada em casa e alguém atacado por um urso durante uma caminhada.

Os voluntários pensavam que as histórias eram reais, mas cada cenário foi cuidadosamente projetado para testar a empatia e a disposição de uma pessoa em ajudar. E os resultados surpreenderam.

Os resultados indicaram uma falta geral de generosidade entre os voluntários. Por exemplo, os participantes em um dos experimentos ofereceram-se para doar menos de um terço do montante máximo possível que haviam recebido com essa finalidade durante o estudo. Uma análise mais detalhada dos dados de vários experimentos revelou uma tendência intrigante: Quanto mais falhas os participantes viam em uma vítima, menos dispostos eles estavam a doar.

"Eles estão dizendo que a vítima não merece ser ajudada," disse Boyer.

Cooperação x exclusão

Estudando a intersecção entre antropologia e psicologia, o professor Boyer se interessa há muito tempo pela maneira como os humanos tratam os membros menos afortunados da sociedade. Do ponto de vista antropológico, observa ele, as pessoas têm uma longa história de cooperação. Os cientistas encontraram restos mortais de caçadores e coletores pré-históricos que viveram durante muitos anos após uma lesão debilitante, prova irrefutável de que se beneficiaram da generosidade de outros.

Ao mesmo tempo, a história humana está repleta de exemplos de pessoas que foram culpadas pela sua própria doença ou infortúnio, talvez porque quebraram um tabu ou irritaram um deus.

O principal objetivo desse tipo de pesquisa é desvendar os processos de pensamento que podem levar as pessoas a abandonar o impulso básico de ajudar os necessitados. "Estamos tentando criar um modelo do que acontece na cabeça de uma pessoa para produzir essas ideias," disse Boyer.

E essa disposição de encontrar falhas nos outros às vezes pode tomar um rumo sombrio. Embora não tenha feito parte do estudo, Boyer observa que as vítimas de agressão sexual são muitas vezes denegridas por usarem roupas provocantes ou por se colocarem em circunstâncias inseguras, minimizando o crime da pessoa que cometeu a agressão. "É um exemplo clássico de culpar a vítima," disse ele.