Privacidade última
Há poucos dias, a revista científica Nature lançou uma nota de preocupação sobre o acesso de cientistas a dados genéticos da população sem garantia de privacidade.
Agora os cientistas avançaram um pouco mais, e começaram a usar o Facebook para tentar arrebanhar doadores daquilo que alguns estudiosos de ética chamam de "privacidade última": o próprio DNA.
A Escola de Saúde Pública da Universidade de Michigan (EUA) batizou o novo projeto de "Genes for Good" - "Genes para o Bem".
GenÉtica com Ética
Há muito tempo, especialistas conscienciosos vêm alertando que a genÉtica precisa ter a ética em seu centro.
E não se trata apenas de um cuidado especial no caso dos "bebês projetados", mas das muitas dúvidas que existem entre os próprios médicos e cientistas sobre os exames genéticos de câncer, que têm sido objeto de um marketing agressivo pelas empresas, mas que podem fazer mais mal do que bem.
O problema desses testes, segundo as próprias entidades de pesquisa em genética, é que eles podem predizer uma possibilidade, nunca a certeza de uma doença. Isto sem esquecer do funcionamento do processo científico normal, no qual estudos costumeiramente são contestados quando as técnicas e os métodos de pesquisa avançam. Ou seja, o risco indicado com base em um estudo considerado válido hoje, poderá ser contestado quando o conhecimento científico se aprimorar.
DNA no Facebook
Desta forma, coletar o DNA de usuários do Facebook em troca da análise desse DNA, e depois enviar os resultados a essas pessoas sem nenhum critério ou acompanhamento profissional, poderá ter efeitos devastadores sobre uma quantidade enorme de voluntários - pessoas que poderão ou não vir a ter uma doença no futuro.
Milhares de falsos positivos, erros de análise e voluntários emocionalmente fragilizados são mais do que suficientes para transformar o pretenso "genes para o bem" em "genes para o mal".
"Colocamos uma pergunta bem curta no Facebook para lembrar as pessoas de enviarem as informações. Esperamos que as pessoas achem o aplicativo envolvente e participem." disse o Dr. Gonçalo Abecasis, diretor da Escola de Saúde Pública da Universidade de Michigan.
"Os participantes podem ter seu DNA analisado, e os resultados desta análise, o seu genótipo, serão enviados de graça," acrescentou o Dr. Scott Vrieze, da Universidade do Colorado, membro da equipe.
Ocorre que não se trata apenas de "tornar aplicativos envolventes", como se fosse apenas mais um utilitário que as pessoas baixam para avaliar em seus celulares e depois apagam quando não gostam.
Um resultado do tipo "você tem x% de risco de ter câncer" é algo que não se deleta apertando um botão, e os cientistas parecem não estar levando em conta os custos de lidar com o impacto que seus voluntários "envolvidos" terão que arcar sozinhos em suas casas.
Comparação de DNAs
As preocupações com a privacidade anunciadas pela equipe do "Genes for Good" parecem questionáveis: segundo anúncio emitido pela Universidade de Michigan, "os participantes também poderão rastrear os componentes de sua saúde e atividades ao longo do tempo, além de poder se comparar com os outros participantes do estudo".
A nota da Universidade acrescenta que "um objetivo eventual é tornar a plataforma e os dados resultantes amplamente disponíveis para a comunidade científica sem nenhum custo, para que os outros cientistas possam desenvolver novas medidas ou novas análises. Identificadores pessoais, como nomes e números de telefone, não serão compartilhados."
O aplicativo ainda não está disponível no Brasil. Para participar, o usuário precisa ter pelo menos 18 anos de idade, viver nos Estados Unidos, com um endereço válido, ser capaz de ler inglês fluentemente e ter uma conta no Facebook.
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