13/01/2023

Anticancerígenos podem ser usados para tratar a fatal sépsis

Redação do Diário da Saúde
Anticancerígenos podem ser usados para tratar a fatal sépsis
A técnica também poderá ser usada em outras doenças inflamatórias, como a artrite reumatoide.
[Imagem: Instituto Gulbenkian de Ciência]

Sépsis e câncer

Pesquisadores portugueses descobriram que alguns medicamentos anticancerígenos também restringem a inflamação, o que os coloca como potenciais tratamentos para a sépsis, uma inflamação generalizada que mata tanto ou mais que o próprio câncer.

A reação exagerada do organismo à infeção, a condição designada por sépsis, mata milhões de pessoas por ano porque, para sobreviver a uma infeção grave, não basta conseguir eliminar o agente infecioso, o que atualmente é feito de forma relativamente eficaz: É também necessário limitar os danos que este agente e a resposta imunológica provocam nos órgãos.

Foi esta segunda componente, que ainda não faz parte da intervenção terapêutica na sépsis, que chamou a atenção do Dr. Ângelo Chora e seus colegas do Instituto Gulbenkian de Ciência.

Eles encontraram a potencial solução para proteger os órgãos contra a sépsis em um grupo de fármacos frequentemente utilizados no tratamento do câncer: as antraciclinas.

A equipe já havia descoberto que estes fármacos conseguem evitar a falência de órgãos em animais de laboratório com sépsis sem afetar a carga do agente infecioso. Esta descoberta inspirou um ensaio clínico, atualmente em andamento na Alemanha, para avaliar se a administração de antraciclinas tem uma influência positiva no curso da sépsis e se reduz o risco de morte dos doentes.

Quimioterápico contra inflamação

Para tirar o máximo partido destes fármacos, contudo, era necessário compreender como é que eles conferem tolerância à infecção. Foi nesta área que a equipe fez novos avanços, mostrando que estes medicamentos anticancerígenos não só conseguem limitar a quantidade de mediadores pró-inflamatórios produzidos pelas células, como bastam doses muito reduzidas para se obter este efeito.

"Descobrimos que as antraciclinas controlam genes inflamatórios importantes nas células do sistema imunitário," explicou a professor Ana Neves-Costa, coordenadora da equipe. Uma vez que formam complexos com o DNA das células, os quimioterápicos impedem a ligação de fatores necessários para a expressão destes genes. Como resultado, as células produzem menos moléculas inflamatórias.

"Este novo mecanismo é particularmente importante porque exclui os efeitos secundários causados pela administração de doses elevadas destes compostos na quimioterapia," acrescentou Ana.

A descoberta deste mecanismo abre caminho para que as antraciclinas sejam usadas também para tratar outras doenças causadas por uma resposta inflamatória exagerada, como a artrite reumatoide.

"Uma vez que já são recorrentemente utilizados na prática clínica para o tratamento do câncer, reaproveitar estes fármacos será bastante mais fácil do que começar do zero. É provável também que a regulação da expressão genética e a limitação da inflamação descritas neste estudo sejam fatores importantes, e até agora desconhecidos, para a eficácia das antraciclinas no tratamento do câncer," disse o Dr. Luis Moita, membro da equipe.

Checagem com artigo científico:

Artigo: DNA damage independent inhibition of NF-?B transcription by anthracyclines
Autores: Angelo Ferreira Chora, Dora Pedroso, Eleni Kyriakou, Nadja Pejanovic, Henrique Colaço, Raffaella Gozzelino, André Barros, Katharina Willmann, Tiago Velho, Catarina F. Moita, Isa Santos, Pedro Pereira, Silvia Carvalho, Filipa Batalha Martins, João A. Ferreira, Sérgio Fernandes de Almeida, Vladimir Benes, Josef Anrather, Sebastian Weis, Miguel P. Soares, Arie Geerlof, Jacques Neefjes, Michael Sattler, Ana C. Messias, Ana Neves-Costa, Luis Ferreira Moita
Publicação: eLife
DOI: 10.7554/eLife.77443
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