05/12/2022

Anti-inflamatórios comuns na infância danificam esmalte dentário

Com informações da Agência Fapesp
Anti-inflamatórios comuns na infância danificam esmalte dentário
Experimentos iniciais com animais de laboratórios comprovaram os efeitos dos medicamentos anti-inflamatórios na mineralização dos dentes.
[Imagem: FORP-USP]

Anti-inflamatórios e cáries

Medicamentos anti-inflamatórios de uso comum na infância podem estar ligados a defeitos de desenvolvimento do esmalte dentário, que hoje ocorrem em aproximadamente uma em cada cinco crianças no mundo.

Dentistas da USP (Universidade de São Paulo) de Ribeirão Preto depararam-se com o problema no dia a dia do atendimento, registrando um aumento considerável no número de crianças atendidas com dor, manchas brancas ou amarelas e sensibilidade e fragilidade dos dentes, que inclusive acabam fraturados pela força da mastigação.

Todos esses sintomas são clássicos dos defeitos de desenvolvimento do esmalte dentário do tipo hipomineralização, cuja causa central ainda é desconhecida. Mas as consequências - lesões de cáries - aparecem mais rapidamente e com maior frequência nesses pacientes, além de suas restaurações apresentarem menor adesão e mais falhas - pessoas com esse histórico chegam a trocar dez vezes mais as restaurações ao longo da vida.

Depois de levantamentos iniciais, a equipe partiu para investigar especificamente os efeitos de medicamentos como o celecoxibe e a indometacina, que pertencem à classe dos anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) e representam - ao lado do paracetamol - o primeiro degrau da escada analgésica da dor da Organização Mundial de Saúde (OMS).

Uma coincidência despertou a curiosidade dos pesquisadores para se aprofundar no tema: a idade dos pacientes. Os primeiros anos de vida, quando os defeitos no esmalte se formam, coincidem com a época em que doenças são mais frequentes, muitas vezes com febres altas.

"Essas doenças geralmente são tratadas com anti-inflamatórios não esteroidais, que atuam inibindo a atividade das enzimas cicloxigenases (COXs) e a produção da enzima prostaglandina, cujos níveis se apresentam aumentados," contou o professor Francisco de Paula Silva. "Entretanto, sabemos que as cicloxigenases e a prostaglandina são fisiológicas para o esmalte dentário, o que nos levou a questionar se esses medicamentos não estariam interferindo no curso da formação normal dessa estrutura."

Mineralização dos dentes

A equipe começou estudando o problema em animais de laboratório, que facilitam a análise e o acompanhamento.

Quando eles tomaram celecoxibe e indometacina, o tratamento praticamente não gerou diferenças visíveis a olho nu nos dentes.

No entanto, quando os pesquisadores iniciaram as extrações, chamou atenção o fato de que os dentes quebravam com maior facilidade. Análises por método de imagem e de composição química indicaram impacto na mineralização dos dentes, que continham menos cálcio e fosfato, importantes para a formação do esmalte dentário, e sua densidade mineral era menor.

Os cientistas constataram que proteínas importantes para a mineralização e a sinalização para diferenciação celular se apresentavam alteradas, indicando que o tratamento com os medicamentos impacta, de alguma forma, a composição do esmalte dentário.

"Neste momento, o estudo nos oferece um norte para entender um novo ator que pode estar envolvido nos defeitos de desenvolvimento do esmalte dentário, já que até então caminhávamos às cegas," disse o professor Francisco, adiantando que agora o estudo prosseguirá com pacientes humanos.

"Vamos resgatar a história das crianças com defeitos e seu uso dos medicamentos e correlacionar, em um estudo clínico, esses dois dados para verificarmos se isso também ocorre em humanos. Assim, poderemos estabelecer o que deve ou não ser consumido e criar, no futuro, um protocolo de tratamento adequado," explicou o pesquisador, que compara a situação com o caso do antibiótico tetraciclina, não recomendado a crianças por causar manchas e escurecimento dos dentes.

Checagem com artigo científico:

Artigo: Enamel biomineralization under the effects of indomethacin and celecoxib non-steroidal anti-inflammatory drugs
Autores: Juliana de Lima Gonçalves, Ana Caroline Alves Duarte, Luciano Aparecido Almeida-Junior, Fabrício Kitazono de Carvalho, Alexandra Mussolino de Queiroz, Maya Fernanda Manfrin Arnez, Lúcia Helena Faccioli, Francisco Wanderley Garcia Paula-Silva
Publicação: Nature Scientific Reports
Vol.: 12, Article number: 15823
DOI: 10.1038/s41598-022-19583-w
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