21/01/2010

Tratamento prolonga vida de pacientes com doenças intestinais

Rosemeire Soares Talamone - Agência USP

Síndrome do Intestino Curto

A Síndrome do Intestino Curto (SIC) é ocasionada pelo infarto da veia mesentérica que pode levar à necrose total ou parcial do intestino, comprometendo o funcionamento do órgão. A SIC também pode ser desencadeada por outros fatores que levam a redução do intestino, como traumas e tumores, por exemplo.

No Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP, um Programa para Tratamento Nutricional de Pessoas com Síndrome do Intestino Curto (SIC) faz da instituição uma referência no Brasil para pacientes do Sistema Único da Saúde (SUS).

O Programa foi implantado em 1992 por um grupo multidisciplinar coordenado pelo professor Julio Sérgio Marchini, da Divisão de Nutrologia, do Departamento de Clínica Médica da FMRP.

O programa vem alcançando resultados cada vez mais expressivos ao longo dos últimos 20 anos.

Nutrientes e vitaminas

Como o intestino é responsável pela absorção dos nutrientes e vitaminas necessárias à sobrevivência, as pessoas acometidas com a SIC precisam de uma alimentação especial, que pode incluir a nutrição via parenteral, uma espécie de medicamento com proteínas, açúcares, lipídeos, minerais, vitaminas e água.

Essa nutrição é feita através de um cateter, que é fixado próximo ao coração, em sessões regulares, cujos intervalos variam de paciente para paciente. O procedimento exige internação para ser realizado.

Falta de acesso dos pacientes

Segundo o professor Julio Sérgio Marchini, essa Síndrome representa um dos quadros mais sérios e graves de má absorção de nutrientes e vitaminas, essenciais para a sobrevivência de uma pessoa.

"Em média uma pessoa tem cerca de 300 centímetros de intestino delgado. As pessoas com a SIC têm menos de 10% desse órgão. Nestas situações é impossível manter a vida se alimentando somente pela boca, com alimentos usuais. É necessário colocar um cateter próximo ao coração, para criar uma via que permita a introdução dos alimentos, o que chamamos de terapia dietética, diretamente na veia", conta Marchini.

Segundo o professor, um número muito pequeno de pacientes com a síndrome chegou no serviço. "Arrisco dizer que menos de 5%, cerca de 3 a 4 casos novos por ano, entram no Programa de Nutrição Parenteral", afirma. Em 2009, o Programa para Tratamento Nutricional de Pessoas com Síndrome do Intestino Curto do HCFMRP atendeu 12 pacientes portadores da SIC.

Orientação e conscientização

Segundo a professora Selma Freire de Carvalho da Cunha, que integra a equipe, além da experiência com os cuidados na implantação e manuseio do cateter, uma porta de entrada para infecções, há outro diferencial no programa no HCFMRP. Trata-se da orientação correta e do trabalho de conscientização para que o paciente valorize também uma dieta oral equilibrada como fonte dos nutrientes necessários para sua sobrevivência.

A alimentação via cateter geralmente é preparada na Divisão de Farmácia do Hospital das Clínicas, como um medicamento de uso exclusivo endovenoso. Os cateteres, feitos de titânio ou de um plástico especial, são implantados pelo cirurgião vascular.

"Se não fosse este cateter e a alimentação especialmente preparada na Farmácia, a expectativa de vida destes pacientes seria de no máximo seis meses. Com a sistematização criada para o tratamento ao longo desse período no HCFMRP e o know-how que adquirimos, temos pacientes que já passaram dos dez anos convivendo com a doença", diz Marchini.

Terapia endovenosa

O programa do HC de Ribeirão Preto é desenvolvido por médicos, enfermeiras, auxiliares e técnicos de enfermagem, nutricionistas e farmacêuticos que atuam na Divisão de Nutrologia.

"Além da terapia endovenosa com proteínas, açúcares, lipídeos, minerais, vitaminas e água, em quantidades variadas para cada perfil de paciente, a dieta via oral também tem que ser adaptada. Existem casos em que a pessoa se adapta tão bem à dieta oral balanceada que até deixa a endovenosa", relata a professora Carla Nonino Borges, integrante da equipe.

Tratamento a domicílio

Atualmente, o serviço vem trabalhando no desenvolvimento do tratamento a domicílio. A professora Selma Freire de Carvalho Cunha, responsável pela novidade, diz que na Europa e Estados Unidos os governos pagam para o tratamento endovenoso na casa do paciente. Ele recebe os nutrientes no período noturno, por profissionais especializados.

"No Brasil, isso ainda não é realidade e os pacientes, em alguns lugares, correm o risco até de passar o resto da vida internados."

Para a enfermeira Maria do Rosário Del Lama de Unamuno, da Divisão da Nutrologia e que está no programa desde o início, a equipe altamente treinada, os cuidados para evitar infecção no manuseio do cateter e facilidade para oferecer alimentação parenteral proporcionada pelo HCFMRP são fatores determinantes para o sucesso do tratamento. "Essa é uma alimentação de alto custo, que precisa ser preparada em farmácia especializada e com padrão determinado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária."

Responsabilidade do paciente

A enfermeira, contudo, aponta que as chances de sucesso aumentam muito com a participação do paciente nas decisões. "Ele é quem se conhece e informa quando precisa da alimentação parenteral".

Segundo ela, o fato de o paciente participar ativamente da terapia dá a ele responsabilidade para decidir se está na hora de se internar, se é preciso intervir.

Assim, ele corre menos riscos de contrair infecções, uma vez que passa menos tempo hospitalizado e "vai para casa sem limitação, pois sabe que deve evitar gorduras, frituras, coisas que podem causar diarreia", enfatiza. A enfermeira lembra, ainda, que o diagnóstico precoce também colabora para que o paciente não chegue a necrose total do intestino e tenha mais chance de sucesso no tratamento.

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