13/02/2009
Jogo da Pizza estimula a nutrição saudável entre os alunos
Fernanda Marques
O Jogo da Pizza é constituído das seguintes peçasNULL prato de papelão, que representa a massa da pizza; 33 cartas, que representam os ingredientes da pizza; duas tabelas, uma com a relação dos ingredientes e outra denominada placar alimentar; e um tubo d[Imagem: Fiocruz]
Estratégia convencional
O professor pede aos alunos que abram o livro numa determinada página e leiam sobre os alimentos, que, de acordo com suas funções no organismo, dividem-se em três grandes grupos: energéticos, construtores e reguladores.
Lêem também que as proteínas exercem funções estruturais, enquanto os carboidratos fornecem energia e os lipídios servem como reserva de energia. Mas será que esse tipo de ensino, baseado na memorização de conceitos, é a melhor estratégia?
A professora Maria de Fátima Alves de Oliveira, com mais de 30 anos de carreira dando aulas de ciências, concluiu que não e elaborou uma proposta inovadora para falar de alimentos e nutrição com seus alunos: o Jogo da Pizza, desenvolvido durante seu doutorado na Fiocruz, sob a orientação do professor Maurício Luz.
Trocando o bom pelo ruim
A idéia do jogo surgiu não só a partir da constatação de que era preciso inovar na metodologia de ensino, mas também a partir da observação de que os alunos não merendavam na escola, mas compravam lanches no entorno do colégio. Ou seja: eles trocavam a refeição saudável oferecida gratuitamente na escola por doces e salgadinhos vendidos na rua.
"A motivação para criar o jogo era justamente mostrar aos alunos o valor calórico dos nutrientes e fazê-los ter uma visão mais crítica sobre aquilo que eles comiam", conta Fátima, que desenvolveu seu projeto em turmas do 8º ano do Ensino Fundamental de uma escola municipal em Campo Grande, bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro.
A unanimidade da pizza
A primeira tarefa da professora foi descobrir qual o alimento que os alunos mais gostavam e não foi difícil constatar que a pizza era quase uma unanimidade.
Em seguida, investigou quais os sabores de pizza mais consumidos pelos estudantes e, a partir dessa informação, fez o levantamento dos ingredientes utilizados na preparação destes tipos de pizza, observando os cardápios das pizzarias do bairro. O passo seguinte foi preparar as cartas que constituiriam os ingredientes do Jogo da Pizza.
O Jogo da Pizza
Com todos esse dados, Fátima elaborou o Jogo da Pizza. O jogo é constituído das seguintes peças: um prato de papelão, que representa a massa da pizza; 33 cartas, que representam os ingredientes da pizza; duas tabelas, uma com a relação dos ingredientes e outra denominada placar alimentar; e um tubo de cola. Cada carta apresenta uma imagem do ingrediente e informações sobre valores nutricionais (quantidade em gramas de cada nutriente e quilocalorias totais da porção).
Ao iniciar a atividade, a professora solicitava que os alunos se organizassem em duplas e cada uma delas recebia um jogo. Os estudantes eram instruídos a imaginar que estavam numa pizzaria e podiam escolher livremente até 20 ingredientes para a construção da pizza. Esta, então, era montada, colando-se as cartas relativas aos ingredientes escolhidos sobre o prato de papelão.
Após a montagem da pizza, a professora solicitava que as duplas preenchessem a tabela contendo a relação dos ingredientes. Nesta tabela, cada dupla registrava o número de porções utilizadas e seus respectivos valores calóricos. Em seguida, era preenchido o placar alimentar, indicando a freqüência com que os nutrientes apareciam na pizza construída pela dupla. "A ênfase nesse momento era saber do que é feito aquilo que comemos", diz Fátima.
Conclusões saudáveis
Quando as duplas terminaram, a professora expôs o placar alimentar geral da turma no quadro e os resultados permitiram algumas discussões importantes. Constatou-se, por exemplo, a baixa freqüência das diferentes vitaminas e de sais minerais nas pizzas, e a virtual impossibilidade de elaborar, com os ingredientes utilizados, pizzas com grande variedade de tais nutrientes.
As discussões posteriores mostraram que os alunos estabeleciam relações do consumo de pizza e alimentos tipo fast food com obesidade e problemas nutricionais. Estas discussões estimularam os estudantes a continuarem a atividade, que demandava cálculo simples para identificar o valor calórico dos nutrientes.
Como se optou por uma aula na qual os alunos expressavam livremente suas hipóteses e idéias, a análise dos registros que eles fizeram nos placares alimentares e nas tabelas sugere que a maioria das duplas foi bem sucedida na identificação dos nutrientes calóricos e na determinação de seus valores calóricos individuais. "Ao final do jogo, cada dupla de alunos-jogadores descobriu que tinha feito uma pizza muito calórica, com elevado teor de carboidratos e lipídios e poucas vitaminas e sais minerais", afirma Fátima.
Proteínas, vitaminas e sais minerais
Após o desenvolvimento da atividade o Jogo da Pizza, os alunos participaram de estudos dirigidos sobre proteínas, vitaminas e sais minerais. Nesta atividade, os jovens faziam leituras e realizavam exercícios que os chamavam à reflexão sobre os conteúdos apresentados.
Concluídos os estudos dirigidos, os alunos montaram outra pizza e a professora constatou algumas mudanças importantes. "Dessa vez, as duplas montaram pizzas menos calóricas, devido aos ingredientes utilizados que continham menos gordura. Outro dado observado foi a diminuição de ingredientes que continham sódio, pois a questão da hipertensão foi bastante trabalhada nos estudos dirigidos", lembra Fátima.
Eficiência do Jogo da Pizza
Para comprovar que o Jogo da Pizza era uma ferramenta eficiente para o ensino de temas relacionados a alimentos e nutrição, a professora utilizou uma atividade de livre associação, desenvolvida duas vezes, antes e depois do jogo. A atividade consistia em escrever o nome do nutriente (proteína, carboidratos, vitaminas, gorduras e sais minerais) no meio de uma folha de papel e pedir aos alunos que escrevessem ao redor palavras e frases associadas àquele nutriente. Os resultados mostraram que, depois do Jogo da Pizza, os jovens apresentavam um maior grau de compreensão sobre os nutrientes.
Apesar dessa maior compreensão dos alunos sobre o tema, a professora não percebeu mudanças dos jovens em relação aos seus hábitos alimentares no ambiente escolar. Antes de iniciar o Jogo da Pizza, ela entregou aos alunos uma agenda alimentar, para que eles escrevessem se merendavam ou não na escola e quais alimentos consumiam no período escolar. "Durante o desenvolvimento da pesquisa, mais de 80% dos alunos continuavam sem merendar na escola e consumindo os lanches do entorno do colégio", lamenta Fátima. Para entender melhor esse fenômeno pelo qual os alunos aprendiam sobre alimentos e nutrição, mas continuavam fazendo opções pouco saudáveis na hora do lanche, a professora fez entrevistas com jovens de diferentes séries.
Afirmação adolescente
Ela observou, por exemplo, que o hábito de merendar na escola ia se tornando cada vez mais raro conforme o aluno avançava nos anos escolares. "Comprar o lanche fora da escola é uma forma de afirmação do adolescente, enquanto a criança obedece mais à orientação da mãe de merendar no colégio", justifica Fátima.
A professora observou também que, entre os alunos que lanchavam fora da escola, o maior consumo era de balas, chicletes e biscoitos. Contudo, mesmo entre os que merendavam no colégio, os alimentos preferidos pela garotada eram arroz, feijão e carnes, em detrimento de legumes, verduras e frutas.
Cedo para alguns, tarde para outros
Perguntados sobre os motivos pelos quais abriam mão da merenda oferecida pela escola, os alunos reclamaram da falta de tempero e do horário em que as refeições são servidas, às 14h30h - muito cedo para quem já almoçou em casa e muito tarde para quem ainda não comeu, conforme alegaram os estudantes.
Eles sugeriram, ainda, tirar o ovo do cardápio, devido ao cheiro enjoativo. "As sugestões dos alunos devem ser consideradas, mas com cautela: afinal, apesar do Jogo da Pizza e das discussões em sala de aula sobre alimentação saudável, houve quem pedisse a inclusão de batata frita no cardápio da merenda escolar", comenta a professora.
As preferências alimentares dos alunos são influenciadas por fatores capazes de induzir uma alimentação altamente calórica, rica em gorduras e carboidratos. "Sabemos da dificuldade em controlar o consumo de alimentos industrializados, comercializados no entorno da escola, mas é importante iniciar desde cedo o uso de metodologias diferenciadas que chamem a atenção para a importância de desenvolvermos hábitos alimentares saudáveis", conclui Fátima.
Fonte: Diário da Saúde - www.diariodasaude.com.br
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