30/05/2008

Cimento comum vai baratear tratamento dentário em crianças

Agência USP

Dentes de leite

Pesquisa inédita na odontologia mundial, desenvolvida na Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB) da USP, comprova que o cimento portland, largamente utilizado na construção civil, poderá revolucionar o tratamento endodôntico (tratamento de canal).

O trabalho da dentista Ana Paula Camolese Fornetti aponta que o produto mostrou-se eficaz no tratamento da polpa dentária (nervo) em crianças com dentes de leite, com vantagens terapêuticas e financeiras. Os resultados do estudo serão divulgados em uma entrevista coletiva nesta quinta-feira (29), na FOB, em Bauru (interior de São Paulo).

Cimento é melhor e mais barato

Apesar dos resultados, a adoção do material dependerá de novas pesquisas, tanto em dentes decíduos (de leite), quanto permanentes. O estudo faz parte do projeto de Mestrado de Ana Paula, desenvolvido na disciplina de Odontopediatria do Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva da FOB.

Segundo a dentista, o cimento portland poderá substituir os dois principais produtos existentes no mercado para tratamento endodôntico, o formocresol e o MTA (agregado trióxido mineral). "A vantagem com relação ao primeiro é que o cimento é biologicamente compatível com os tecidos dentários", diz a dentista, "e com o segundo, é o preço, pois o MTA tem um custo muito elevado".

Biocompatibilidade

Foram avaliadas 68 crianças entre 5 e 9 anos de idade. "Além da redução de custos, o cimento traz a vantagem da biocompatibilidade, ou seja, o organismo aceita naturalmente o material, o que não acontece com o formocresol de Bukcley, substância introduzida em 1904 e mundialmente utilizada até hoje", conta a dentista. "Pesquisadores do mundo inteiro buscam alternativas capazes de unir ganhos terapêuticos e econômicos para esse tipo de tratamento", diz Ana Paula.

R$210,00 contra R$0,30

O cimento não traz conseqüências carcinogênicas (relacionadas ao câncer) e nem é tóxico. "Quanto ao formocresol, mesmo apresentando resultados satisfatórios, não há unanimidade na comunidade científica quanto aos seus efeitos colaterais", compara a dentista. "Já o MTA é biocompativel, porém tem um preço elevado em comparação aos seus concorrentes". Um grama do produto custa R$210,00, enquanto o valor médio de um quilo de cimento nas lojas de construção é de R$0,30. Um frasco de 20 ml de formocresol custa R$4,40.

Bactericida

De acordo com o professor da FOB, Ruy César Camargo Abdo, orientador da pesquisa, os resultados obtidos com o cimento portland são semelhantes aos apresentados pelo MTA, sob o ponto de vista terapêutico. "A única diferença é que no MTA é acrescido o óxido de bismuto, uma substância radiopaca que permite visibilidade radiográfica, mas que não apresenta nenhuma função terapêutica", explica. "O cimento de construção é feito basicamente de calcário, não traz toxidade neste tipo de utilização e é bactericida por natureza, uma vez que possui um pH altamente alcalino". O produto utilizado na pesquisa foi esterilizado.

MTA e Formocresol

O estudo conclui que o cimento portland é uma alternativa mais barata para o MTA e, conseqüentemente, também um substituto para o formocresol. A pesquisa foi iniciada em 2005 e as etapas clínicas e avaliações em 2006. Além da aplicação na polpa dentária de dentes de leite, o uso do cimento está sendo estudado para procedimentos de retro-obturação, reparo de perfuração de raiz, entre outros tratamentos endodônticos em dentes permanentes.

Avaliações de longo prazo

A pesquisadora recomenda que novos estudos em humanos sejam conduzidos antes de assegurar a indicação definitiva do cimento, tanto em pulpotomias de dentes decíduos (de leite), permanentes ou em outros campos da odontologia. "Serão necessárias principalmente avaliações em longo prazo e estudos microscópicos", ressalta Ana Paula. "A utilização do cimento é bastante freqüente em estudos com animais, mas esta é a primeira vez que a ciência comprova sua a eficácia em humanos". O estudo foi aprovado pelo Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) do Ministério da Saúde.

 

Fonte: Diário da Saúde - www.diariodasaude.com.br

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