15/10/2020

Antibiótico de 80 anos é reprojetado para novos usos médicos

Redação do Diário da Saúde
Antibiótico de 80 anos é reprojetado para novos usos médicos
A cor rosa destaca a localização de seis aminoácidos que foram alterados nas versões sintetizadas da molécula de gramicidina A.[Imagem: Hiroaki Itoh et al. - 10.1038/s41467-020-18711-2]

Natural e bom para os humanos

Os produtos naturais, sobretudo as plantas medicinais, estão na base de quase toda a farmacoquímica desenvolvida pela ciência.

Acontece que os produtos químicos naturais foram projetados para beneficiar seu hospedeiro, e não necessariamente para a segurança ou eficácia em humanos.

Essa incompatibilidade inspirou químicos da Universidade de Tóquio (Japão) a alterar produtos naturais úteis para um uso melhor e mais seguro nas pessoas.

Essa abordagem já permitiu que eles transformassem um dos antibióticos mais antigos do mundo em versões que - em testes laboratoriais preliminares - parecem ser medicamentos mais seguros e mais fortes do que os antibióticos disponíveis hoje nas farmácias e hospitais.

Gramicidina A

A gramicidina A foi descoberta originalmente em bactérias do solo e se tornou o primeiro antibiótico fabricado comercialmente, no início dos anos 1940. Ela continua a ser receitada pelos médicos hoje em dia como um creme tópico ou um colírio para algumas infecções de pele, olhos e garganta - infelizmente, ela não pode ser usada como comprimido ou injeção.

A gramicidina A mata as bactérias perfurando sua membrana celular, essencialmente fazendo a célula "vazar" por meio de túneis de tamanho nanométrico, chamados canais iônicos. Ocorre que esses canais de íons desregulados causam a mesma destruição nas células humanas quando a gramicidina A é usada dentro do corpo.

Os cientistas há muito são fascinados pela ação da gramicidina A nos canais iônicos porque eles são quase universais entre os seres vivos. Os canais iônicos humanos estão envolvidos em tudo, desde a função cerebral até a pressão arterial. Cerca de 350 análogos artificiais da gramicidina A foram desenvolvidos nos últimos 80 anos, todos com propriedades semelhantes às do original e, portanto, também não podem ser usados em humanos.

"Normalmente, a síntese de produtos naturais é uma tarefa muito difícil e complicada. Existem muitas etapas para fazer essas moléculas grandes e, no final, os rendimentos sintéticos são muito baixos, então abordagens sintéticas, como a síntese de um composto de uma gota que usamos, ainda são incomuns com produtos naturais," disse o professor Hiroaki Itoh.

A equipe acredita ter encontrado um meio de superar essas dificuldades.

Biologia sintética

A gramicidina A é uma espiral de 15 aminoácidos, os blocos de construção dos peptídeos, que são proteínas curtas. Os pesquisadores começaram selecionando estrategicamente seis desses aminoácidos, que poderiam ser alterados sem perder aspectos essenciais da estrutura normal da gramicidina A.

Cada um desses seis aminoácidos pode ser trocado por quatro aminoácidos diferentes para mudar a forma como os peptídeos se unem, levando a um total de 4.096 variações.

Eles começaram a testar suas novas versões da gramicidina A para atividade contra a infecção bacteriana comum causada por estreptococos. Os melhores desempenhos foram avaliados quanto à sua capacidade potencial de não matar células humanas indiscriminadamente, testando ainda suas reações com células do sangue de coelho e células de leucemia de camundongos. Todos os resultados foram extremamente encorajadores.

"O mais importante é que esta estratégia pode ser usada para outros tipos de produtos naturais e outros compostos formadores de canais iônicos. Há muito tempo se acredita ser muito difícil realizar a atividade formadora de canais iônicos seletivos para espécies [diferentes de seres vivos], mas nosso estudo mostrou que a gramicidina A pode ter uma atividade muito seletiva para bactérias. Acredito que esse pensamento pode mudar o padrão dos produtos naturais formadores de canais iônicos," disse Itoh.

Testes adicionais serão necessários para confirmar que os novos sintéticos de gramicidina A não fazem mal aos diversos tipos de células humanas.

 

Fonte: Diário da Saúde - www.diariodasaude.com.br

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