Fibras contra citocinas
Pesquisadores da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) descobriram que compostos produzidos pela microbiota intestinal - as bactérias benéficas do nosso intestino - reduzem a expressão de um gene importante para a entrada viral nas células e de um receptor de citocina que favorece a inflamação.
Os casos mais graves de covid-19 envolvem um fenômeno conhecido como tempestade de citocinas, que levam a um colapso geral do organismo e à morte.
A quebra de fibras alimentares no intestino não interferiu na entrada ou na replicação do vírus SARS-CoV-2 no intestino, mas a redução das citocinas pode ser uma ótima notícia porque diarreia, vômito e dor abdominal podem acometer até 50% dos pacientes de covid-19 e 17,6% dos casos graves.
Essas alterações estão em parte associadas à entrada do vírus nas células intestinais e a alterações de suas funções normais. Além disso, estudos recentes indicam que indivíduos acometidos pela doença apresentam modificações importantes da microbiota intestinal, incluindo diminuição de bactérias que produzem ácidos graxos de cadeia curta - moléculas que regulam as células intestinais e de defesa do organismo.
Por conta disso, os pesquisadores testaram se esse tipo de ácido graxo teria efeito direto na infecção de células intestinais pelo SARS-CoV-2. Outros trabalhos já indicavam que a alteração na microbiota intestinal e em seus produtos poderia modificar a resposta imune durante o quadro infeccioso.
"Em trabalhos anteriores, observamos em animais que compostos produzidos pela microbiota intestinal participam da proteção contra infecção respiratória. Naquele caso, usamos como modelo o vírus sincicial respiratório [RSV], causador da bronquiolite e bastante comum em crianças. Resultados semelhantes foram obtidos em estudos conduzidos por outros grupos de pesquisa, com diferentes doenças respiratórias", explicou a pesquisadora Patrícia Rodrigues.
Proteção contra inflamação
No trabalho mais recente, amostras saudáveis de tecido do colón intestinal e de células epiteliais da mesma região foram infectadas com o novo coronavírus em laboratório e analisadas em seguida.
"Não houve diminuição da quantidade de vírus, que foi a mesma tanto nas células e tecidos tratados com os ácidos graxos de cadeia curta quanto nas amostras que não receberam o tratamento. No entanto, as amostras de biópsias intestinais tratadas apresentaram queda significativa na expressão do gene DDX58 [receptor do sistema imune inato que detecta ácidos nucleicos virais e ativa uma cascata de sinalização que resulta na produção de citocinas pró-inflamatórias] e do receptor de interferon-lambda, que medeia a atividade antiviral. Também ficou menos expressa a proteína TMPRSS2, importante para a entrada do vírus nas células", detalhou a professora Raquel Leal.
Outros testes mostraram, nas biópsias infectadas não tratadas, aumento da expressão do gene DDX58, que codifica um importante receptor viral. Além disso, verificou-se também maior expressão de interferon-beta (IFN-beta), molécula pró-inflamatória que participa do fenômeno conhecido como tempestade de citocinas, associado com os casos mais graves de covid-19.
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