11/05/2017

Célula tumoral é reprogramada para combater o câncer

Com informações da Agência Fapesp
Célula tumoral é reprogramada para combater o câncer
Nova estratégia está sendo testada em humanos no tratamento da leucemia mieloide aguda.
[Imagem: Wikimedia Commons]

Contra-ataque

Fazer com que as próprias células tumorais se voltem contra o câncer é a estratégia inovadora que está sendo usada por pesquisadores canadenses para tratar a leucemia.

O tratamento consiste em reprogramar as células tumorais para fazê-las produzir uma substância que estimula o sistema imunológico a combater o câncer.

A primeira fase de ensaios clínicos, cujo objetivo é atestar a segurança do método, está sendo realizada no Centro do Câncer Princesa Margaret, em Toronto, sob a coordenação do imunologista Christopher Paige.

"Estamos testando essa abordagem no tratamento da leucemia mieloide aguda (LMA), um tipo de câncer que tem origem na medula óssea e acomete as células brancas do sangue. Caso funcione, o mesmo princípio poderia ser usado contra qualquer tipo de tumor com potencial para causar metástase", disse Paige.

Reprogramação celular

A técnica consiste em retirar células tumorais do próprio paciente a ser tratado, reprogramá-las com o uso de um um vírus e injetá-las de volta no organismo em uma única aplicação. O objetivo é fazer com que as células malignas modificadas passem a expressar a proteína interleucina-12 (IL-12), uma citocina pró-inflamatória capaz de estimular o combate à doença.

"Para conseguirem crescer e se disseminar pelo organismo, os tumores precisam ser capazes de neutralizar os radares do sistema imune. As células malignas, muitas vezes, secretam substâncias que fazem com que as células de defesa se tornem tolerantes ao corpo estranho. A IL-12 é capaz de reverter esse perfil de tolerância", explicou Paige.

Essa citocina pró-inflamatória atua em diferentes níveis, podendo ativar um tipo de célula de defesa chamado linfócito T auxiliar (LT CD4+), capaz de secretar grandes concentrações de outra citocina chamada interferon-gamma (IFN-Γ), que por sua vez aumenta a atividade de outras células de defesa, como os macrófagos. A IL-12 também pode ativar os linfócitos do tipo NK (Natural Killer ou células exterminadoras naturais), importantes no combate a células tumorais e ajuda a maturar os linfócitos citotóxicos (LT CD8+), que atacam diretamente células estranhas ao organismo.

"Nossa hipótese é que, ao serem recolocadas no paciente, as células reprogramadas vão se espalhar pelo organismo e alcançar os órgãos linfoides [locais onde predominam os linfócitos, como a medula óssea, o timo, os linfonodos e o baço]. Lá elas ativariam o sistema imune, que passaria a atacar tanto as nossas células reprogramadas quanto as demais células leucêmicas. Esse é o plano," contou Paige.

Um paciente por mês

A estratégia se mostrou segura e eficaz nos testes pré-clínicos feitos com camundongos. Além de eliminar a doença, proporcionou aos animais sobrevida equivalente à de roedores sadios - em torno de dois anos.

Até o momento, somente uma pessoa recebeu o tratamento. Foi aplicada uma pequena quantidade de células reprogramadas com o objetivo de verificar se há algum tipo de resposta imune, quais células de defesa estão sendo recrutadas e dosar os níveis das substâncias pró-inflamatórias liberadas.

"Vamos acompanhar esse paciente durante 30 dias, tempo suficiente para termos certeza de que não estamos causando nenhum mal ao seu organismo. Ao final desse período, se tudo correr bem, trataremos um segundo paciente. E assim continuaremos, tratando um por mês, até atingirmos 10. Devemos demorar ao menos um ano para avaliar a segurança e termos uma ideia mais clara de como o método funciona em humanos", disse Paige.

O principal risco, segundo o pesquisador, é que o excesso de IL-12 no organismo possa desencadear uma tempestade de citocinas inflamatórias, o que poderia prejudicar o funcionamento dos órgãos e até mesmo levar à morte. Nos testes pré-clínicos, porém, não foram observados efeitos adversos graves.

Leucemia Mieloide Aguda

A leucemia mieloide aguda se caracteriza pela rápida proliferação de células brancas anormais, que não amadurecem, não desempenham sua função e ainda se acumulam na medula óssea, interferindo na produção das outras células sanguíneas, como hemácias e plaquetas.

Os sintomas são muito variados, podendo incluir dor nos ossos, perda de peso, aumento dos nódulos linfáticos, anemia, infecções recorrentes, hematomas e hemorragias. A progressão costuma ser rápida, podendo atingir os nódulos linfáticos, fígado, baço, cérebro, medula espinhal e testículos.

A doença representa 25% dos casos de leucemia em adultos e é o tipo que apresenta a mais baixa taxa de sobrevida. Atualmente, o principal tratamento é a quimioterapia, que pode levar à remissão total da doença na maioria dos casos. Porém, segundo Paige, mais de 70% dos pacientes apresentam retorno da doença em menos de um ano.

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